"RESQUÍCIOS DEPRESSIVOS, SUJOS E NOJENTOS" trata-se de textos onde exponho de forma irônica, metafórica, crítica e subversiva a condição humana. Esse blog pode causar estranhamento e até mesmo raiva, pois mistura o real com o fictício sem embelezamentos, indo a fundo no que o ser humano tem de pior: a ignorância, a covardia, os tormentos, a utilização da sexualidade de forma desrespeitosa, os vícios, a solidão, etc. Qualquer semelhança entre fatos e os textos aqui presentes é mera coincidência. As características do texto não representam necessariamente o ponto de vista do autor que vos escreve.

Respeite a arte! Ao reproduzir em outros lugares a obra de algum artista, cite o autor. Todos os textos aqui presentes foram escritos por Mao Punk.

sexta-feira, 7 de outubro de 2016

AS CANÇÕES EM MEUS OUVIDOS

As pessoas se sentem mal ao escutar canções de sofrimento, de dor, de paixões perdidas, de amores impossíveis. Eu não. Eu me sinto mal quando eu escuto as canções de amores correspondidos, de paixões compartilhadas, de felicidades mútuas… Essas, sim, me doem!

E me doem porque, quando eu as escuto, elas não dizem absolutamente nada sobre mim, embora eu pense em você. E por isso me dói tanto! Porque enquanto eu ouço essas canções, essas letras intensas, essas declarações musicais, imagino você as escutando e pensando no grande amor da sua vida. E não sou eu.

Nas estrofes e rimas felizes de corpos unidos, de lábios grudados, de entrega de alma, nunca fui eu. Nunca serei eu. Eu não sou uma música. Eu sou o chiado, o ruído no rádio, o risco no disco, a interferência. Eu não sou som que valha os quatro minutos de uma música. Eu não valho o pensamento que acontece enquanto a música toca. Eu não emito o som que eu queria em seu coração.


E é isso. Que você possa escutar essas músicas deitada com quem você ama. Que possa escutá-las pelas ruas lembrando e sentindo o quanto esse amor faz parte de você, o quanto vocês se completam, o quanto é eterno, o quanto você espera reviver esse momento e o quanto espera aqueles beijos, aqueles abraços, o sexo cheio de desejo, a entrega cheia de amor… Que possa escutar essas músicas e sentir que foram feitas para vocês. E quando eu as escutar, terei certeza que, à parte de minha dor, você merece essas canções em seus ouvidos.


domingo, 3 de janeiro de 2016

PIMENTA NA MÃO DOS OUTROS

Com gentileza, ela pediu que lhe passasse o molho de pimenta:

- Por favor, você poderia me passar a pimenta depois de usar?

Assim que terminou de usar, ele colocou o frasco do molho sobre a mesa.

- Você não escutou o que eu disse?! – Perguntou indignada – Ei! A pimenta!

- Desculpa! Aqui está – Ele pegou novamente o frasco e estendeu a mão a ela.

Sem que ela colocasse uma gota sequer do molho em seu lanche, bateu o frasco com certa força na mesa e reclamou:               

- Será que você não presta atenção em nada? Que saco! É mais fácil comer sozinha do que comer com você, porque pelo menos teria um galheteiro com tudo o que eu quero à minha disposição.

- Você está falando sério? – Perguntou ele em um tom calmo, porém desconfiado.

- Não, não! Estou mentindo! Não existem galheteiros na porra de nenhuma lanchonete. – Disse ela em tom irônico – O que você acha? Pareço estar brincando com você?

- Céus! Você nunca falou assim comigo! Eu não acredito que você se irritou por conta de um frasco de molho de pimenta!

- Não é a merda do frasco, cacete! É você!

- Eu?! Você não pode estar falando sério! O que está acontecendo? Estou espantado com sua atitude!

- Eu não aguento mais! É muita coisa para eu aguentar! – O tom dessa vez pareceu, de certa forma, desesperado. Ele segurou suas mãos com força. Indagou:

- O que você tem que aguentar? Fala para mim. Sabe que estou aqui para ajudar no que for preciso.

Com a mão direita ela apanhou o copo de suco, enquanto a mão esquerda permanecia segurando a mão dele com força. Deu um ou dois grandes goles.

- Não, não é nada. Esquece. É que... – Olhou nos olhos dele por três segundos, depois disso desviou o olhar. Não suportou o olhar seguro que ele transparecia, aquele olhar firme, decidido, tomado de razão e sentimento. Vagarosamente ele soltou sua mão esquerda.

- Eu entendo. Eu entendo... – Lamentou-se ele.

Com a mão esquerda trêmula, ela apanhou novamente o frasco do molho de pimenta e deixou-o cair ao chão. O frasco quebrou-se em pedaços. Nada mais poderia ser aproveitado.

Após segundos eternos de silêncio, os dois, com olhos marejados, perguntaram um ao outro:

- E a conta, quem é que paga?